Na semana do Oscar, com ingresso a R$ 1 e filmes iranianos, sala em Salvador ‘sobrevive’ até com único espectador
À medida que a glamourosa festa do Oscar se aproxima, todos correm para os cinemas para assistir os filmes que foram indicados. Afinal de contas, ninguém quer ficar de fora de um dos assuntos mais comentados pelos amigos, vizinhos, colegas de trabalho, familiares e afins.
É como se a premiação provocasse uma espécie de apartheid. Quem não assistir os filmes se sente um verdadeiro peixe fora d’água – expressão que indica estar em um ambiente estranho ao seu.
E a expectativa para a festa deixou de ser, há muito tempo, um sentimento restrito aos cinéfilos – aquele que ama e tem interesse pelo cinema enquanto arte. Pelo contrário. Numa verdadeira corrida contra o tempo, os jovens, adultos e idosos correm para os cinemas comerciais, instalados nos shoppings, para assistirem os filmes indicados e assim poderem acompanhar a apuração e escolha dos prêmios de cada categoria no dia da festa – que é televisionada, ao vivo, para todo o mundo.
Contrafluxo
Faltando apenas cinco dias para o tão comentado Oscar – que vai acontecer no próximo domingo (28/2), em Los Angeles, nos EUA – a equipe do Aratu Online resolveu mostrar as pessoas que vão na contramão da grande festa e optam por filmes artísticos exibidos nas salas de arte, ao invés dos chamados blockbusters – filmes exibidos para o grande público e com grande retorno financeiro.
As 200 poltronas fincadas no carpete da sala de arte Walter da Silveira, na Biblioteca dos Barris, são maioria absoluta quando o assunto é a ocupação do ambiente. E o vazio se repercute durante todo o ano. Situação inversa ocorre nas salas de cinema comerciais, as quais têm público – e lucratividade – durante todo o ano. Haja Oscar ou não.
Nossa equipe de reportagem se programou para assistir a sessão das 17h desta terça-feira (23/2) com o filme “Um craque chamado Divino”, com ingresso no valor único de um real. Pelo menos esse era o filme que constava na programação do cinema divulgada nos jornais impressos da capital baiana.
Além da nossa repórter, havia apenas três pessoas na sala. Pontualmente às 17h as luzes se apagaram, a tela acendeu e começou o filme. Tudo estaria indo nos conformes se não fosse o ar-condicionado quebrado e a exibição de um filme diferente daquele que estava sendo divulgado na programação dos jornais diários. Foi apresentada uma série de três documentários (cada um com duração de 30 minutos) do roteirista e diretor Penna Filho. Os documentários, nas suas respectivas ordens de exibição foram: Féndô – Tributo a uma guerreira; Naturezas mortas e Victor Meirelles – Quadros da história.
Importante ressaltar também que o charmoso café que fica do lado de fora da sala está desativado. O café era também um atrativo para os frequentadores do local. “Tinha dias que eu ia pra Walter da Silveira com meu namorado só pra gente tomar um café e comer na lanchonete. Era tudo gostoso”, admitiu a advogada Clara Sobral.
Segundo informações da bilheteria, a empresa que administrava a lanchonete teve seu contrato vencido e uma nova licitação está sendo feita para a escolha da empresa que deverá assumir futuramente. A administração não soube informar o prazo que nova empresa deve se estabelecer no local.
Frequentador assíduo do local há três anos, Arlei Pereira, de 30 anos, comentou sobre a constante desocupação do espaço. “Acho que falta mais divulgação e uma programação que incentive principalmente os jovens a virem pra cá. Percebo que as poucas pessoas que vêm tem entre 30 e 45 anos”, disse.
Apesar das críticas, Pereira admitiu gostar do estilo mais artístico e ressaltou que o grande público tende a não se adaptar a produções diferentes daquelas de Hollywood. “As pessoas têm que aprender a apreciar os filmes diferentes daqueles que estamos acostumados e que nos são empurrados com tanta publicidade e divulgação. Os filmes exibidos aqui são indianos, russos, iranianos… São raros, muitas vezes antigos e com poucos ou nenhum efeito especial. Mas isso muda a percepção de vida e de cultura de uma pessoa”, enfatizou.
Em uma breve conversa, a também frequentadora das salas de arte de Salvador Clara Sobral revelou alguns pontos negativos que são facilmente percebidos por aqueles que costumam habitar o local. “Acho os horários de exibição dos filmes restritos, muitas vezes são em horários em que a maioria de nós está estudando ou trabalhando. A segurança também é precária principalmente aos domingos quando os cinemas são mais cheios, mas em compensação as ruas ficam mais vazias. Algumas coisas poderiam melhorar sim, mas quero deixar claro que nada disso me impede de ir assistir aos filmes. Eu adoro as sessões das salas de arte e me sinto bem no ambiente”, explicou.
Menor e com capacidade para 50 pessoas, a sala Alexandre Robatto, que também é localizada na Biblioteca dos Barris ao lado da Walter da Silveira, está desativada temporariamente. “Nesse período de festa de dezembro, janeiro e fevereiro a sala não costuma funcionar por falta de público e atividades. Mas a Alexandre Robatto é muito utilizada em geral para apresentações de vídeos e palestras”, afirmou o gerente Emanuel Roxo.
Números
A Walter da Silveira – mais antiga sala de arte da Bahia – atualmente possui três sessões diárias às 15h; 17h e 19h de domingo a domingo. A programação é alterada de sete em sete dias, sempre as quintas-feiras. Além do programador, a estrutura conta com três projecionistas, dois bilheteiros, dois serviços gerais, dois seguranças e um gerente.
Segundo dados da bilheteria, no mês de janeiro de 2016 foram utilizados 547 ingressos de pessoas pagantes; 146 convites e 235 entradas em filmes gratuitos, dando uma média de 30 telespectadores por dia. Já do dia 1º de fevereiro até esta terça-feira (23/2), foram vendidos 257 ingressos, utilizados 40 convites e não houve nenhuma sessão gratuita.
De acordo com o gerente Emanuel Roxo, a sessão das 15h desta terça teve maior lotação que as demais sessões, com 12 ingressos vendidos, representando uma ocupação de 6% da sala. As compras foram para o filme ‘O Estranho Mundo de Jack’, do diretor Tim Burton. “O horário que temos mais público hoje em dia é esse das 15h”, revelou o gerente.
“Eu procuro vir às 15 ou às 17h, mas no horário das 19h eu nunca venho ver filme aqui porque a rua fica muito deserta e o bairro é perigoso”, disse Juliana Moutinho.
Oscar
Voltando a falar da temática, os filmes do Oscar também serão exibidos na Walter da Silveira a partir desta quinta-feira (25/2). Mas calma, cinéfilos “Oscarianos” de plantão! Serão os filmes que concorreram aos prêmios em 2015. Afinal, programações com ‘delay‘ também fazem parte das salas de arte e são apontadas pelo público como principal motivo de afastamento dos jovens do local.
Fonte: Aratu Online
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